quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Ídolo ou não, lá vai ele!

Os recentes fracassos – se é que podemos usar este termo tão pesado – de nosso tenista número um, Thomaz Bellucci, me fizeram voltar a pensar no que já escrevi antes sobre a pressão que o paulista sofre para ser um ídolo no esporte. Olha, quanto mais penso nisso, menos tendo a concordar com o que parece ser a opinião da maioria, isto é, não acho que devamos cobrar de Thomaz que ele seja um ídolo, top ten ou qualquer coisa do tipo. Veja meus argumentos.

Em primeiro lugar, ser um ídolo é algo muito diferente e maior do que ser um grande atleta, com bons resultados. Quantos atletas brasileiros têm o respeito e a admiração de seu povo como o tem o grande Zico? E ele não carrega no currículo a metade das conquistas de Pelé, que é muito mais respeitado pelo que fez do que de fato pelo que é. Michael Schumacher possui sete títulos mundiais, mas em quase todas as eleições de revistas especializadas é de Ayrton Senna o título de maior de todos os tempos, mesmo tendo conquistado menos da metade dos títulos do alemão. Voltando ao tênis, o incomparável Guga se tornou uma lenda no esporte aqui no Brasil. Ele é respeitado e admirado no mundo inteiro, idolatrado pelos tenistas tupiniquins e objeto de verdadeira adoração do seu povo. Isso sendo “apenas” um jogador de tênis, esporte de nenhuma tradição por aqui. Nos EUA, Sampras é o tenista de maiores conquistas no esporte, seguido por Agassi. Em quadra, o primeiro era – pelo menos em minha opinião – bastante superior ao segundo, mais genial e dono de maiores recursos, mas o marido de Steffi Graf é um ídolo de maior expressão, mesmo tendo se envolvido em várias confusões e polêmicas ao longo da carreira. Sampras é mais respeitado tecnicamente; Agassi o é simplesmente por ser Agassi. Se formos analisar o campo das artes isso fica ainda pior. Quantos e quantos artistas sem muito talento se tornam ou se tornaram verdadeiros ícones em suas gerações, ao passo que alguns talentosíssimos acabaram jogados ao ostracismo? A vida é repleta desses exemplos, é só prestar atenção. E é por causa disso tudo que digo, sem medo de me achar precipitado, que Thomaz Bellucci nunca será um ídolo de expressão nacional, mesmo que se torne um dia o número um do mundo. Por quê? Fácil: porque ele não tem aquele “algo mais” que o leve até lá. Não estou falando de seu jogo, da parte técnica, estou falando dele, do próprio Thomaz. Ser um ídolo é algo que não se tem muita escolha, ou você é ou você não é. Quantos fãs tem Kim Clijsters e quantos tem Justine Henin? Qual das duas joga mais tênis? O carisma, a aura, a sensibilidade natural para se colocar, se comunicar e ser compreendido sem esforço nascem com a pessoa, não se ensina em academias ou centros de treinamento. Bellucci não tem isso e nem precisa ter. O problema não é ele, mas sim o povo brasileiro, que quer lhe dar características que não são possíveis de serem adquiridas.

O que acho pior nessa história toda é que parece que ele quer ter isso para poder responder à pressão que sofre. Bellucci, meu filho, para com isso! Deixa disso! Sai dessa! Você não é o Guga – e isso não é, nem de longe, uma ofensa ou crítica, ok? – e nem precisa ser! Você tem que ser você mesmo e ir em frente, jogando seu tênis e buscando evoluir sempre. O povo que se vire pra entender que você é assim, mais sisudo, introspectivo e caladão mesmo. Nelson Piquet foi tricampeão e gênio nas pistas sem se tornar um décimo do ídolo que Senna é. Relaxa. Vai buscar o que é seu na sua profissão e pronto, ok?

O outro lado da questão é o aspecto técnico. Aí, sim, a coisa complica bem mais. O brasileiro vem jogando mal – pelo menos neste início de temporada – e não apresenta a postura em quadra que se espera dele ou de qualquer um que se candidate a top ten. Todo atleta, ídolo ou não, deve entrar em uma partida ou disputa “com a faca entre os dentes”. No tênis, onde o jogo depende só de você, onde você não tem outros companheiros para te ajudar, o jogador precisa estar sempre no limite. Bellucci, no momento, não parece estar. Sua capacidade de “voar” durante os jogos e se abater com isso é, em minha opinião, o que mais lhe atrapalha, junto, é claro, com a pressão que carrega nas costas – ou na raquete. Esta tem pesado uns dez quilos, neste início de ano. Mas parte disso é culpa dele. Graças ao ótimo fim de temporada no ano passado, Thomaz começou o ano dizendo que ia buscar o top ten, juntando-se a Larri Passos para atingir este objetivo. O povo brasileiro criou uma expectativa absurda, como se o ex-técnico de Guga fosse um mago e o tênis um esporte fácil. O processo de adaptação dos dois pode levar uma temporada inteira para acontecer. Larri modificou tudo que Bellucci entendia sobre seu próprio jogo. Não é de uma hora para outra que se assimila isso, jogando dez anos anteriores de um estilo no lixo. É claro que o paulista vai sentir dificuldade de adaptação, óbvio que vai. É injusto reclamar dele agora. Nesse aspecto, pelo menos, é. O que não pode acontecer – e tem acontecido – são as “voadas”. Thomaz precisa de mais poder mental, de mais concentração e, principalmente, capacidade de assimilar seus erros, deixar o ponto para trás e ir em busca do próximo. Remoer o que passou diminui sua atitude/coragem em quadra, fazendo o adversário crescer, o que torna tudo muito mais difícil. Lembro-me de Fernando Meligeni, que era – e ainda é – amado pelos brasileiros, mesmo sendo argentino de nascimento. O motivo disso? O que fazia em quadra. Não era um gênio, mas doava a vida a cada ponto, com orgulho estampado no rosto de estar ali. Se Bellucci chegar nesse nível fico satisfeito. Pode morrer sem ganhar mais um título, mas fico satisfeitíssimo.

O mais importante para os brasileiros que acompanham Thomaz agora é ter ciência de que chegar a ser o número 21 do mundo pode ser o ápice de sua carreira. E, se assim for, temos que enaltecê-lo do mesmo jeito. Se um dia a seleção de futebol da Venezuela se classificar para uma copa do mundo e for às oitavas de final o país para, vira feriado, os atletas ganham estátuas, medalhas e tudo que tiver direito. O futebol lá é tão popular quanto o tênis aqui. Temos que respeitar alguém que consegue chegar ao top 30, pessoal. É uma obrigação nossa.

Fico imaginando se Andy Murray fosse brasileiro. Coitado do britânico. Se lá a coisa já é feia pra ele, imagina por aqui...

Vamos dar tempo a Bellucci, pois tenho certeza que não existe um brasileiro que queira mais que ele se torne um gigante em seu esporte do que ele próprio. E só ele pode correr atrás disso. Aumentar a pressão sobre ele só piora as coisas. Vamos ter paciência com o rapaz, pois, ídolo ou não, ele vai em busca do que todos – inclusive ele – querem e esperam.

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